27.11.06

Um dos mais intrigantes e importantes movimentos na arte do século 21?


Clique no título para ver este documentário sobre "uma nova forma de arte", o "Graffitti removal".
O vídeo é bem filmadinho e tal, com musiquinha hipnótico-cabeça e narradora com voz de pessoinha inteligente etc. Mas que embuste é esse de dizer que "A pintura de remoção dos graffitis se tornou um dos mais intrigantes e importantes movimentos na arte do século 21"?
Importante e intrigante para quem, cara pálida?
A mocinha que narra o filmezinho compara ainda o tal "Graffiti Removal" ao movimento abstrato expressionista (devia estar pensando em Mark Rothko), ao minimalismo, ao construtivismo russo e - pasmem - completa a sucessão de asneiras com a pérola:
"O graffiti removal é uma continuação progressiva destes movimentos e um passo importante no futuro da arte moderna..."
Ai, pelamordedeus! A arte moderna já foi há 100 anos atrás!
Esses caras não têm mais o que fazer e ficam inventando arte onde ela não existe, ou pelo menos qualquer intenção artística jamais existiu. Enviam seus filmezinhos para concursos de vídeo arte e ganham mais verbas para continuar regando suas árvores de baboseiras.
" O que torna esta arte tão intrigante é o fato de que o artista que a criou está inconsciente da sua realização artística" diz a narração.
Então tá, daqui a pouco vão dizer que o sangue na calçada onde antes havia um corpo é uma obra pictórica onde o finado também a criou sem intenção alguma, num processo inconsciente (bota inconsciente nisso), fruto do encontro casual entre forças antagônicas, um registro preciso do elemento humano em transformação do físico para o etéreo; o resíduo tátil de um instantâneo da realidade. O sangue na calçada é enfim uma obra de arte máxima, onde o artista inconscientemente deu tudo aquilo que possui de mais precioso para viabilizar sua concepção. É uma obra trágica e ao mesmo tempo repleta de uma poética urbana peculiar, que materializa-se naquela impressão a sangue coalhado de moscas na calçada.
Damien Hirst não faria melhor com seu bezerrinho fatiado no tanque de formol (que eu inclusive gosto bastante)

26.11.06

Novo filme de Jean-Pierre Jeunet


Soube que o cineasta francês de Amélie, Jean-Pierre Jeunet, está trabalhando em um novo filme baseado no livro "The Life of Pi", que deu ao seu autor, o canadense Yann Martel, o Booker Prize da Inglaterra (uma das maiores distinções da literatura mundial). Tive a oportunidade de ilustrar a crítica do New York Times na época do lançamento do livro (essa monotipia aí).
Trata-se de uma história sensacional sobre um menino indiano chamado Pi, que é sobrevivente de um naufrágio que traga toda a sua família em mudança para os EUA junto com seu zoológico particular.
Sozinho no pequeno bote, Pi tem como como companhia apenas um enorme tigre de bengala. Haviam outros sobreviventes no bote, mas estes acabaram na barriga do tigre. Então, Pi tenta manter-se vivo e de fato sai-se muito bem nesta tarefa ao longo do livro.
Na época do prêmio Booker, a imprensa especializada aqui "cantou a pedra" de que o enredo desta história de Yann Martel havia sido chupado do livro "Max e os Felinos", escrito pelo brasileiro Moacyr Scliar. De fato, logo nas primeiras páginas do "The Life of Pi" há um agradecimento especial de Martel ao próprio Scliar.
Espero que o filme seja tão maravilhoso quanto o livro (e em se tratando de Jean-Pierre Jeunet, acho que podemos todos ficar sossegados). Vou procurar o livro Max e os Felinos, pois acho o Moacyr Scliar um escritor maravilhoso.

Nefelibata



Certa vez uma amiga leu nalgum lugar que eu me apresentava como artista gráfico e "nefelibata". Então me escreveu para perguntar o que era um nefelibata. A palavra tem um som interessantíssimo, é bem verdade...
Expliquei a ela que o sufixo é o mesmo de acrobata ou "habitante das alturas". "Acro" está em acrofobia, ou medo de altura.
O Nefeli vem de nuvem. Então, nefelibata fica como "habitante das nuvens".
Na verdade quisera eu ser um nefelibata. A realidade dos prazos desesperadores dos projetos mantém-me cada vez mais aterrado.

O triunfo da Pintura


Quando eu terminar de escrever este post já estarei nos primeiros minutos do dia 26 de novembro.
O blog vai ficar um tempinho de lado pois estou no meio de um turbilhão...
Preparei recentemente um datashow para uma aula abordando um pouco da história e importância do desenho até o século XXI. Puta tema interessante, mas que infelizmente teve que ser apresentado em 50 minutos e com pouco menos de 40 imagens. O lado positivo é que isso me obrigou a escolher dentre muitos somente os que achei mais interessantes.
Dentre outras coisas falei de Lascaux, de Joseph Campbell e os mitos, de Durer e os iconoclastas na Alemanha da Reforma de Lutero, das gravuras de Rembrandt, Goya e Kathe Kollwitz, dos artistas Picasso, Matisse, Diego Rivera, e também a Secessão de Viena (da qual Klimt era membro). Mostrei croquis de Niemeyer, Lucio Costa e Le Corbusier, projetei as coisas que estão sendo feitas na arquitetura contemporânea quando se usa o computador para desenhar, falei de Raymond Loewy e seu Streamlining, mostrei desenhos do diretor Akira Kurosawa, falei de Will Eisner e Maus, da street art, grafitti e intervenções urbanas. Mostrei os cadernos do Gauguin, os croquis de Degas e as confissões visuais de Frida Kahlo. Cheguei até a nova onda de arte figurativa iniciada indagora pela galeria Saatchi de Londres. Essa é a mesma que lançou o "Sensation" (grupo que tinha Damien Hirst e seus tanques de formol com tubarões e bezerros fatiados, e também a excelente pintora Jenny Saville). Em breve falo deles aqui.
(Quando eu resolver aprender a editar a parte gráfica do blog juro que transformo em links ativos todos estes nomes que citei!)
Pois é, a mesma galeria Saatchi está lançando agora a novidade "In Triumh of painting", que é uma nova onda de arte figurativa. Os responsáveis por este revival no desenho da figura humana são os chamados "Young German Artists" (o assunto deu até capa no caderno "Mais" da Folha de São Paulo há um tempo atrás). Alguns destes artistas vieram de uma antiga escola de arte que funciona na cidade de Leipzig, antiga Alemanha comunista. Diz-se que o currículo por lá segue com uma forte carga de aulas de modelo vivo, composição, pintura, etc
Para saber o que é o "In Triumh of painting" vá em http://www.saatchi-gallery.co.uk
A imagem que acompanha este post é do Daniel Richter, que faz algo que os críticos e teóricos -sempre eles - já rotularam de neo-surrealismo.
Assim que a água baixar por aqui e eu conseguir botar a cabeça pra fora, retorno com uns rabisquets meus e de outrem.
Esse lance de escrever para meia dúzia de amigos notívagos é coisa de desocupado mesmo.
Se alguém escrever "até" me animo a passar por aqui

14.11.06

A cor


Em 1666, Isaac Newton publicou sua célebre obra "Opticks" onde descreve dentre outras coisas o procedimento que resultou na decomposição da cor branca em sete cores principais. Esta foi uma idéia que, de certa forma, resgatou uma teoria ainda mais antiga, formulada por Aristóteles. O grego defendia a tese de que o fenômeno da cor era nada mais do que um enfraquecimento da luz branca, ou, melhor dizendo, o resultado da interação da luz branca com a obscuridade. E disse ainda que, além do branco e do preto, eram sete as cores principais.
Quase duzentos anos antes de Isaac Newton, Leonardo da Vinci já havia se detido sobre o fenômeno da cor e observado que "o branco, visto ao sol e ao ar, tem sombras azuladas, pois o branco não é uma cor senão o resultado de outras cores". Antecipando-se a Isaac Newton, Da Vinci formulou sua própria teoria:
" Chamo de cores simples aquelas que não podem ser feitas pela mescla de outras cores...O branco - se bem que alguns filósofos não aceitem nem ao branco nem ao preto como cores - porque um é a causa do outro, e o outro a privação da cor...Enfim, o branco colocamos em primeiro lugar. O amarelo, o verde, o azul, o vermelho e o preto vêm em continuação..."
Desde muito tempo, foram célebres os cérebros (!) que se detiveram no estudo do fenômeno da cor, de Demócrito e Platão, Goethe, os impressionistas e também Josef Albers e os visionários da escola Bauhaus. Filósofos, místicos, físicos, astrólogos e até artistas deram seus pitacos a respeito.
A cor é um tema onde se combinam conhecimentos de física, óptica, neurologia, química, psicologia, e mesmo antropologia e história. O estudo sobre elas pode ser uma experiência apaixonante ou tediosa, a depender do livro que lhe caia nas mãos (eu por exemplo nunca consegui ler o "Da Cor à Cor Inexistente", considerado a "vaca sagrada" na literatura técnica da cor por aqui pelo Brasil).
De todas as formas de estudo de cor, existe uma que considero das mais apaixonantes: pegue um bom livro com obras de Marc Chagall, Van Gogh, Hokusai, Odilon Redon, Basquiat, Rauschenberg, Mark Rothko, Wayne Thiebald, Richard Diebenkorn, enfim, escolha o seu...Busque identificação com os seus coloristas; assim como nos deixamos influenciar pela forma, deixemo-nos influenciar e embriagar pela paleta dos mestres. E que se fodam as teorias sobre comprimentos de onda e estímulo de cones e bastonetes!

Regras e leis sobre o certo e o errado em arte

Vejam que interessante este raciocínio:
"É fascinante observar um artista esforçando-se por realizar o equilíbrio certo, mas se fôssemos perguntar por que fez isso ou aquilo, talvez ele não fosse capaz de nos explicar. O artista não obedece a qualquer regra fixa. Ele simplesmente pressente o caminho que deve seguir.
É verdade que alguns artistas ou críticos em certos períodos tentaram formular leis de sua arte, mas verificou-se sempre que artistas medíocres não conseguiam coisa alguma quando tentavam aplicar estas leis, ao passo que os grandes mestres podiam transgredi-las e, apesar disto, realizar uma nova espécie de harmonia que ninguém pensara antes."
Um outro sujeito, chamado Franz Weissman, disse algo no mesmo viés, só que em outras palavras:
"Sigo minha intuição e corrijo as imperfeições. Primeiro nasce a obra; a teoria vem depois."

Perceberam? Sem talento não há livro que dê jeito. Tem que botar a mão na massa.

A Perfeição artística

Disse Baudelaire:
"Uma boa pintura , fiel e igual ao sonho que a fez nascer, deve ser criada como um mundo. Do mesmo modo que a criação que vemos é resultado de várias criações, das quais as primeiras se tornaram sempre mais completas pelas seguintes, assim também uma pintura, se trabalhada harmoniosamente, consiste de uma série de imagens sobrepostas, onde cada nova camada dá realidade ao sonho e faz com que ele escale um outro degrau no sentido da perfeição."

Alguém me diga por favor quantas pinturas esse senhor Baudelaire fez? O que ele descreve é uma completa romantização do processo criativo. Dê-se um pincel a este senhor e ele só saberia usá-lo pra escrever.

Análise artística freudiana



" I want to do something good, if that's what perfection means"
Disse Lucien Freud, plantando bananeira no sofá ao lado de sua filha (lá pelos idos de 1995)

A forma do Homem


"Dentre todas as formas que desde o início da civilização mais interessaram ao homem, a forma humana é a que se destaca. O que nós procuramos e valorizamos em um trabalho de arte é a sua relação com a vida, a sua relevância emocional e intelectual para com a experiência humana"
Disse o escultor suíco Giacometti

9.11.06

Revista Piaui

Saúdo a chegada de mais uma revista Piauí às bancas. Novamente uma capa ilustrada em traço simples porém com conteúdo instigante, irônico e pop.
Ainda não fui ao banheiro suficientes vezes para dar cabo de minha segunda edição, mas louvo desde já o projeto gráfico que novamente privilegia o uso de ilustrações.
Conversei com o jornaleiro para saber a quantas andam as vendas e ele disse que o lote já pede reposição ao final do dia. Reparem como ela se destaca na banca... Tudo culpa daquela capa ilustrada!
Nota-se que existe alguém de cultura visual por trás do projeto (como sabemos, a revista foi fundada pelo cineasta João Moreira Salles).
Caso a Piauí prossiga com este padrão gráfico na edição 3, lhe desejarei vida longa. Mas se pintar uma capa daquelas bem lugar-comum, com fotinha e photoshoppinzinho etc, sentirei-me na obrigação de tocar o meu trombone de vara desafinado aqui no blog.
Quem sabe os responsáveis pela Piauí estão pensando em resgatar uma antiga tradição visual, porém com uma roupagem mais contemporânea?
Quando penso no exemplo da New Yorker , uma revista que há quase 80 anos vem às bancas semanalmente com uma capa ilustrada... É uma maravilhosa história da arte da ilustração (já passaram por lá o Steinberg, Al Hirschfeld, e dentre os vivos, o Mattotti e o Peter de Seve).
No Brasil, tínhamos na revista "Para Todos" um exemplo sensacional de direção gráfica, e as capas do ilustrador J. Carlos que eram maravilhosas.

Editores de arte, aprendam mais essa: ilustração vende!

Tentáculos


Espiralando-se continuamente, os tentáculos criam um moto-contínuo que alude ao oro-boros, ou a serpente que forma o ciclo autofágico de vida e morte. Mas que tolice, este é apenas o desenho de um tentáculo!
Sempre digo que a primeira pessoa que pegou um polvo e disse "vou comer isto", teve muita coragem. Hoje sei que dentre os frutos do mar, nenhum consegue ser mais saboroso.
Quando pintar um tempo aqui vou parar pra procurar minhas fotos de pescarias na Bahia, quando ainda um moleque de 19 anos.

Fishboy


Esta saiu na revista Playboy dos EUA há alguns anos atrás. Foi para um conto chamado "Fishboy". Curiosamente, o desenho já estava pronto antes mesmo de eu ter recebido o texto. Foi criado para ilustrar uma entidade divinal e antropomórfica, ou seja, um deus metade homem metade animal. Peixes são sempre um bom tema. Culinário inclusive

Mechanix Fish


Esta ilustração fala de fé e profecias sobre o fim do mundo. Logicamente a alusão não é direta, muito menos subliminar. Apenas é e pronto. Às vezes não me interessa que o desenho seja uma descrição literal e feijão-com-arroz do tema, mas pelo contrário, algo que coloque o observador em algum momento de enlevo ("decifra-me ou te devoro").
Usei aqui diversos elementos,colagens e fotos, inclusive uma que tirei de um cristo crucificado todo feito de sucatas soldadas (a escultura original fica na catedral de Saint John, the Divine em NY).
Peixes...

3.11.06

Nossa senhora dos afogados


Este é um detalhe de uma ilustração criada após a leitura de um livro extraordinário sobre um naufrágio. Trata-se de um relato verídico da tragédia do baleeiro Essex, uma história que veio inclusive a inspirar o escritor Herman Melville a escrever o seu Moby Dick. Devo dizer que poucas vezes um livro me impressionou tanto.
Chama-se No Coração do Mar, de Nathaniel Philbrick.
A ilustração aqui não nenhuma relação direta e pontual com a história narrada no livro. Imaginei apenas essa figura feminina mágica a percorrer os mares sobre uma longuíssima perna de pau, enquanto dá alento aos náufragos que flutuam sozinhos pelos mares mundo afora. Quem quiser a imagem de corpo inteiro precisa ir no meu site e clicar em "Portfolio>Editorial"

Quando imagino as horas dos náufragos... Não deve existir no mundo uma morte pior que esta.

Fala Livro.



Livros, livros...precisamos de uma vida em anexo, correndo em paralelo à esta, somente para nos dedicarmos à eles.

Agora falando sério...

Já me peguei conversando repetidamente sobre este cenário meio estéril de idéias coletivas na arte, especialmente aquelas criadas para a reprodução em massa. São as artes mais democráticas, já dizia a artista alemã Kathe Kollwitz.
Alguns papos-cabeça com amigos artistas deixam sempre subentendidos uns temas sem cabresto ou rabiola. A conversa flui entusiasmada mas não resulta em ações concretas.
Deixa então eu derramar aqui meu vaso de frases-mal-feitas, colhidas ao longo destas mesas de debate.
Tanta gente criativa por aí que ainda trabalha e pensa como se vivesse em uma ilha isolada. A elas bastam a internet e as revistas descoladas.
E a moçada de talento que só se permite ser artista quando está inscrita em um workshop? Agrupar-se coletivamente é sinônimo de tomar um chope ao final da aula (embora nem isso a maioria faça).
Existem os criativos que não saem do estúdio pra ver gente, conversar, trocar, fazer junto ou simplesmente ouvir. E tantos outros que só são artistas gráficos quando precisam resolver o problema de um cliente, e assim ganhar dinheiro pro pão e a gasolina.
Me ressinto de não ver na rapaziada hoje aquele desejo de se reunir e inventar oportunidades criativas para si próprios, canais para manifestação de suas idéias, as boas e válidas. A União faz mais do que açucar.
Lamentável o sujeito de olhar aguçado somente para o que não lhe agrada; é uma peneira crítica que deixa passar todo o resto. Ignoram elementos de identificação com o outro; não vêem em seus pares verdadeiras janelas de oportunidade onde podem enriquecer-se no contato com as diferenças.
Tem gente que ignora que um instrutor de workshop muitas vezes age apenas como obstetra mental, ajudando os alunos a darem luz às suas próprias idéias. Ele não precisa ser um dicionário de técnicas ou um tratado de filosofia da arte. Basta criar oportunidades. Traduzindo: "não é tarefa do personal trainer puxar ferro por você"
Por que os chamados trabalhos ditos pessoais precisam ser necessariamente autobiográficos, de auto-celebração, ou simplesmente parte deste avassalador movimento contemporâneo, o "Eu-ismo" ou o "Neo-newism" ?
O artista-interventor que vira a madrugada pelas ruas da cidade pintando alvos - ou cubos, ou colando stickers de bichinhos fofos - nos muros e postes , por dezenas de quilômetros, faz isso por que, pra que e para quem?
Tem também aquele sujeito que é tão inteligente que fala um idioma que ele próprio inventou e apenas ele compreende. Molto fueda!
- "Fale comigo numa língua que eu entenda moço! Senão eu vou entender algo diferente do que você quis dizer! ", disse o público para o mímico.
- "Foda-se você, quem mandou não estudar a obra de Stanislawski, Antonin Artaud e Marcel Marceau!", respondeu o mímico.

Sinto falta de indignação gráfica, manifestações - visuais ou não - que gerem comunicação, que belisquem consciências, que estimulem um pensar OBJETIVO e não um divagar viajandão-cabeça. Ai, isso aí faz minha cabeça de burro doer!
Queria ver nas ruas uns cartazes enormes em silk ou xilo; umas paródias de propaganda política competindo na parede com os atores reais; um Obey Giant tupiniquim, uns murais que não tivessem somente umas palavras enroscadas ao redor de bichinhos; um ativismo gráfico-político; uma revista tipo a Ad Busters; um hip-hopper que não repita a expressão "tá ligado" a cada 5 palavras ...Ah, isto sim já seria uma revolução!
O problema é que hoje parece que vivemos a primazia do "decorativo", o desejo de buniteza, de poeticidade rasa e descartável. E quando vamos ao extremo oposto, a indignação é expressa com feiúra, com argumentação tosca, sem sutilezas, ironias ou inteligência. Deve ser a pressa, os prazos, a grana curta que impede os criadores de se aprofundarem em suas questões, restando apenas arranhar a casquinha de tinta da superfície.
No fundo estas idéias descosturadas são apenas meu desejo de que nossa geração construísse um degrau significativo na história das artes gráficas do país; algo não-copiado de fórmulas de outros lugares com realidades diferentes da nossa; uma arte urbana com mensagem e alto poder de cutucação e espezinhamento público.
A falta de pré-requisitos e referências acadêmico-culturais tem servido de combustível para originalidade. Talvez por isso tanta coisa interessante tem sido produzida nos guetos. Parece que eles estão indicando uma direção.

Arte com poderes mágicos


Numa aula com Marshall Arisman, ele levantou uma tese interessante sobre arte primitiva. Dizia que o artesão da África de 4 ou 5 mil anos atrás não tinha a menor preocupação em assinar suas obras, num sinal evidente do seu desprendimento de ego, despreocupação com reconhecimento, admiração, bajulação e vaidades vãs.
Aqueles objetos criados por mãos munidas de toscas ferramentas, atenderiam à funções bem definidas, fossem como peças utilitárias, artefatos para caça e proteção, como também para assumir papéis específicos em rituais sagrados. Eram amuletos, máscaras, talhas, adornos, imagens, ossos, pedras, penas, peles, madeiras, fibras e sementes, em diferentes arranjos, e poderosamente imbuídos de espíritos ou da capacidade de evocá-los.
Nenhuma daquelas obras tinha qualquer assinatura do artista. Isto era algo completamente sem importância.
Se por um lado aqueles africanos de outrora não puderam ter seus seus nomes registrados nos livros de história, por outro lado, nenhum artista contemporâneo, nem os de nome reconhecido, teve a capacidade de criar obras carregadas de poderes mágicos.

1.11.06

Bienal de São Paulo: embargada a obra inspirada nos quadrinhos de Will Eisner


Estive em São Paulo na última semana de outubro para dar um curso e aproveitei para visitar a Bienal.
Logicamente não gostei de tudo e nem vou me alongar aqui em descrições sobre arte, teorias estéticas ou filosofias de orelha de livro. O assunto é mais sucinto porque hoje é segunda - e eu ainda não aprendi direito como editar esse blog.
A julgar pelo que mais gostei na bienal, o fotojornalismo foi uma forma de expressão recorrente nesta exposição. Vi muitas fotos excelentes, todas com viés narrativo, o que me leva a crer que o ser humano e suas histórias continuam rendendo trabalhos interessantes.
A instalação que mais gostei está nesta foto em anexo. Curiosamente a maior parte do público não a viu porque a Defesa Civil da cidade de São Paulo interditou a passarela de madeira que foi construída para a observação da obra. Notem bem na foto: é uma referência direta ao Will Eisner, que sempre abria as histórias do seu personagem Spirit com um logotipo tridimensional.
Esta foi uma Bienal generosa, e que abriu espaço até para os quadrinhos.