25.6.08
Em Agosto: curso de Aquarela em MG
Em Agosto estarei em São Lourenço para uma oficina intensiva de Aquarela de 3 dias naquela cidade mineira. As inscrições estão abertas e os interessados devem ligar já para garantir uma vaga. Esperamos que a turma esteja 100% preenchida em breve.
Uma das nossas aulas será a "plein air" no Parque das Águas, como faziam os impressionistas.
Tenho as lembranças mais especiais da minha infância naquele parque. Pescava, andava de pedalinho, passeava de charrete, jogava migalhas para os patos, comia pães de queijo e sorvete de milho verde, e lá aprendi também a andar de patins (mas isso eu já esqueci...).
Como estará São Lourenço depois de mais de 30 anos?
24.6.08
Artista favorito
23.6.08
Últimas gravuras à venda
Caros estas são as últimas gravuras digitais disponíveis.
Algumas destas ilustrações viajaram para longe (Salvador, Porto Alegre, Canadá...), outras foram presenteadas ou sorteadas dentre as crianças que foram me ver na feira de livros infantis do MAM. Tive também a honra de ter algumas delas adquiridas por colegas ilustradores de cujo trabalho sou fã.
No anexo estão os últimos exemplares. Resta apenas um de cada!
Depois só em dezembro.
Para levar sua gravura para casa escreva para renatoalarcao@terra.com.br.
O preço promocional é de 40 reais com frete incluso para todo o Brasil, mais a dedicatória e uma carta que leva o meu abraço caligrafado.
Mais detalhes aqui .
20.6.08
2012
Quem convive comigo volta e meia me ouve falar:
"Nem adianta espernear, de 2012 a espécie humana não passa!"
O jeito sarcástico, histriônico faz com que minhas palavras soem como ironia. É da minha personalidade ser gaiato, mas... desta vez ando mesmo preocupado.
2012 é o ano em que termina o calendário maia, aquele que -dizem - erra um segundo a cada 5000 anos.
O protocolo de Kyoto - aquele que fracassou na tentativa de controlar as emissões de CO2 - termina sua vigência em 2012.
Contaram-me também a respeito de um asteróide que está a caminho da nossa esfera azul. Uma ou outra revista científica informou em matérias minúsculas que os cálculos atestam que a montanha que vem do espaço está mesmo com dia e hora certa para uma visita à Terra: 2012. Será que evitam falar nisso mais abertamente para evitar pânico?
Recentemente a NASA juntou-se com o exército americano fez uma simulação de tiro em um satélite obsoleto que estava saindo ligeiramente da órbita e portanto perigava cair por aqui. Deu uma notinha no jornal. Fico aqui a matutar se aquilo foi um treinozinho de tiro ao alvo espacial.
Mas se houvesse mesmo um asteróide vindo em nossa direção, quem você acha que ficaria encarregado de explodi-lo? Os chineses? Os russos? os europeus?
O que mais é dito por aí sobre 2012?
Hum...2012 é também o ano quando se passa a história daquele filme absolutamente ruim chamado "Eu sou a lenda...".
Agora é melhor mudar de assunto.
Estava no taxi em São Paulo e, enquanto trafegávamos na marginal Tietê comentei com o taxista:
"É incrível pensar que há uns 60 anos atrás se realizavam competições de natação e remo nesse rio..."
"É patrão... o pior é que igual a este aí existem hoje mais de mil pelo mundo afora"
"Você já ouviu um papo de que o mundo vai acabar em 2012?", perguntei curioso, só para ouvir o que ele teria a dizer.
"Ihh patrão, esse negócio de mundo acabar vem desde o tempo de Nostradamus. Não rolava aí um papo de que ia acabar no ano 2000 e tal? Mas não aconteceu nada! Veja só nós aqui na praça, na batalha..."
"É meu caro, mas o que é um erro de 12 anos numa profecia? Não é nada! 12 anos é um centésimo de segundo na vida de uma montanha"
O taxista emudeceu por quase um minuto. Depois assentiu com a cabeça.
"O senhor tá certo. 12 anos não é nada mesmo. Perdi meu emprego de diretor de arte numa agência de publicidade já faz 12 anos".
Taxistas têm uma sabedoria peculiar. Passam muito tempo lendo jornais e ouvindo rádio enquanto a fila do ponto não anda.
Mas...mudando de assunto...
No bairro da Liberdade, almoçava com um amigo e em nossa mesa havia duas cumbucas de missoshiro, aquela deliciosa sopa de soja. Já viram como ela decanta rápido? Chega a ficar transparente em cima, a nuvem cremosa por baixo.
Em um momento vi-me com os olhos fixos na sopa, os palitos equilibrando o califórnia no ar quando, repentinamente, o meu amigo interrompeu meu devaneio:
"O que houve cara? Viu olhinhos submergindo na sua sopa?"
"Não. Vi o oceano, todos os oceanos do mundo", respondi com os olhos ainda vidrados na cumbuca.
"Ihhhh...então é grave"
E continuei:
"Cara você já pensou nisso? Todos os rios imundos do planeta carregam a nossa porqueira ladeira abaixo...eles inevitavelmente desembocam no mar. Já pensou como os oceanos devem estar? Já pensou que, embora eles nos pareçam límpidos e saudáveis na superfície, ou então nos seus primeiros duzentos metros, há uma possibilidade concreta deles estarem como esta tigela de missô?
"É verdade..."
"E os peixes? Peixe não é igual vaca ou galinha, que nasce e cresce confinado, come ração, tem veterinário, toma vacina... Peixe é um bicho selvagem, fica a nadar pra tudo que é canto, come o que passar pelo caminho..."
"É mesmo...podicrê..."
"Em geral quem compra peixe olha as guelras, vê se o olho está brilhante, dá uma cafungada e tal, e pronto, atesta que está fresco, leva pra casa e come, certo?"
"Claro, eu mesmo faço isso. Adoro peixe!"
"Mas quem, qual órgão de saúde pública, quem se dá ao trabalho de analisar a carne do bicho REGULARMENTE e a nível celular? Quem se dá ao trabalho de checar se tem ali alguma toxina, dessas que estão diluídas por aí pelos oceanos afora?"
"Cara, come o teu sushi que ele está caindo do palito"
Mudamos de assunto.
Eu tenho andado assim,... minha alma parecida com aquela cumbuca de sopa de soja, cristalina na superfície, mas embotada nos níveis mais profundos...
Sinto que este processo começou depois desse filme aqui.
Hoje desci um degrau a mais nesta sensação. Foi depois de ver este filme
aqui.
A primeira lâmina fez tcham, a segunda fez tchum.
Essa aqui fez tcham, tcham, tchaaaam!
Então boa sorte para nós. E que mantenhamos nossa sanidade até o final, mesmo que ele se demore a vir.
Citações
Garimpei umas citações boas sobre arte. Serão úteis em algum momento, tenho certeza. Vejam aí se estou certo.
Você não pode depender dos seus olhos se a sua imaginação estiver fora de foco.
Mark Twain
Milhares de gênios vivem e morrem sem serem descobertos, nem pelos outros nem por eles mesmos.
Mark Twain
Sem o talento o artista é ninguém, mas o talento também não é nada sem o trabalho.
Anônimo
O ferro enferruja pelo desuso, a água estagnada perde sua pureza e no tempo frio se congela; o mesmo faz a inatividade que embota o vigor da mente.
Da Vinci
Pobre é o pupilo que não supera seu mestre
Da Vinci
Criatividade requer coragem
Matisse
Deus permita que eu sempre deseje mais do que consiga realizar.
Michelangelo
O objetivo da arte não é reproduzir a realidade, mas criar uma realidade da mesma intensidade.
Alberto Giacometti
Levei quatro anos para pintar como Rafael, mas uma vida inteira para pintar como uma criança.
Pablo Picasso
Toda criança é um artista. O problema é permanecer artista uma vez que cresce.
Pablo Picasso
Criatividade é permitir-se cometer erros. Arte é saber quais deles manter
Scott Adams
A Inspiração existe, mas precisa encontrá-lo trabalhando.
Pablo Picasso
Eu te digo, quanto mais penso nisso, mais eu sinto que não há nada mais artístico do que amar as pessoas.
Van Gogh
Você não pode depender dos seus olhos se a sua imaginação estiver fora de foco.
Mark Twain
Milhares de gênios vivem e morrem sem serem descobertos, nem pelos outros nem por eles mesmos.
Mark Twain
Sem o talento o artista é ninguém, mas o talento também não é nada sem o trabalho.
Anônimo
O ferro enferruja pelo desuso, a água estagnada perde sua pureza e no tempo frio se congela; o mesmo faz a inatividade que embota o vigor da mente.
Da Vinci
Pobre é o pupilo que não supera seu mestre
Da Vinci
Criatividade requer coragem
Matisse
Deus permita que eu sempre deseje mais do que consiga realizar.
Michelangelo
O objetivo da arte não é reproduzir a realidade, mas criar uma realidade da mesma intensidade.
Alberto Giacometti
Levei quatro anos para pintar como Rafael, mas uma vida inteira para pintar como uma criança.
Pablo Picasso
Toda criança é um artista. O problema é permanecer artista uma vez que cresce.
Pablo Picasso
Criatividade é permitir-se cometer erros. Arte é saber quais deles manter
Scott Adams
A Inspiração existe, mas precisa encontrá-lo trabalhando.
Pablo Picasso
Eu te digo, quanto mais penso nisso, mais eu sinto que não há nada mais artístico do que amar as pessoas.
Van Gogh
19.6.08
Dr. Frankenstein
Há muitos anos atrás li a versão original do romance gótico "Frankenstein".
O livro, cujo subtítulo era "O Prometeu Moderno", tinha uma capa de couro bem trabalhada pela pátina do tempo e um forte cheiro de biblioteca londrina, o que conferia à ele um certo ar vitoriano. Nele estavam exatamente as palavras que uma jovem de 19 anos chamada Mary Shelley, havia escrito em 1816.
Naquele ano, Mary e seu futuro marido, Percy Shelley, estavam na Suíca em visita ao lorde Byron, um amigo que possuía um confortável chalé à beira do lago Genebra. O grupo passou a noite a prosear sobre diversos temas interessantes, como os avanços recentes da ciência, as novidades tecnológicas e também o sobrenatural (assunto que surge quando os horizontes são incertos e nebulosos). Sim, era uma noite fria e chuvosa, embora esta descrição se pareça um clichê literário.
Impressionava a todos eles as promessas da eletricidade, uma descoberta científica relativamente nova, e também as novidades tecnológicas trazidas por uma revolução industrial que ainda estava na sua infância, mas já evidenciava sinais de que poderia mudar a face do mundo. Graças às fábricas e suas chaminés, Londres já não era a mesma cidade aprazível de outrora.
Após lerem Fantasmagoriana, uma antologia alemã de histórias de fantasmas, os convivas do Chalé lançaram um desafio um ao outro: escrever sua própria história, tão assustadora e envolvente como aquelas que haviam lido juntos. Venceu a jovem Mary Shelley com o seu "Frankenstein or the modern Prometheus".
O subtítulo da obra faz referência ao mito de Prometeu, o titã grego que roubou o fogo dos deuses e o presenteou aos humanos, libertando-os da sua condição primitiva e animalesca. A alusão é óbvia: quando o médico Frankenstein busca conceder ao homem a imortalidade (através de descargas elétricas, a grande novidade da ciência então), ele o liberta da morte, e consequentemente da necessidade ou do temor a Deus.
Dr.Frankenstein brincou de ser Deus, e assim como o titã grego foi severamente punido por sua petulância.
A criatura foi chamada por Shelley de "Adam", o primeiro homem, formado do barro por mãos divinas. Mas, erroneamente, o feioso remendado entrou para a história mesmo como Frankenstein.
No texto original, a criatura ganhou o cérebro de uma criança de 5 anos (talvez por isso tivesse aquele andar desengonçado). Ao chegar nas cidades apanhava de pauladas e era apedrejado devido à sua aparência grotesca. Da mesma maneira como uma criança o faria, ele aprendeu a odiar sentindo na pele a rejeição dos adultos.
A saga do monstro ganhou o mundo em diversas versões na literatura, no teatro, na TV e no cinema, mas a força do original permanece.
A imagem que ilustra este artigo é do meu acervo pessoal e foi feita na técnica de monotipia. Mostra o médico Viktor Frankenstein no ártico à procura do monstro.
17.6.08
Pintando intuitivamente com vinho tinto
Ontem aconteceu a abertura do ilustraBrasil, onde, apesar da gelada noite paulistana, pude encontrar amigos e também ver muitas pessoas com cara de artista (certamente colegas da SIB, traços sem rosto e vice-versa), e passar os olhos por várias ilustrações legais.
Estou a passear entre música boa, vinhos e canapés idem, quando encontro um amigo ilustrador, que apressou-se em apresentar sua companhia: uma moça bonita, vestida com um sobretudo off-white em grosso tecido trançado que ia até a metade das pernas. Figurino elegantemente paulista para aquela noite fria.
Mal colocado entre os dedos da mão esquerda que seguravam a base da taça de vinho tinto, o meu canapé escapole no momento em que preparo-me para cumprimentar a moça. Em gesto intuitivo, tento agarrá-lo em vôo. Mas a intuição não pensa, simplesmente age: para agarrar o canapé uso a mesma mão que segurava a taça de vinho tinto cheia.
Em uma fração de segundo vejo aquela pincelada de vinho em pleno ar rumo ao inexorável encontro com o canvas que era a bela roupa da moça.
Agora havia um mapa vermelho sobre o lindo e grosso tecido off-white do casaco. Não tenho idéia da cara que fiz, mas deve ter sido ridícula. Todas as caras ridículas do mundo estavam grudadas na minha face.
Seguro a moça confortavelmente pelo braço e peço mil desculpas, milhões, todas as desculpas do mundo. Por dentro sentia-me humilhado pela minha burrice, minúsculo pela absoluta falta de lubrificante social.
"Desculpe, por favor, desculpe..."
Aquilo durou um décimo de segundo e eu pude ver que havia tanto vinho derramado que uma pequena poça já se formava entre os pés da moça.
Sim, agora era a hora dela mesma olhar o casaco e ver a merda que eu havia feito. Agora eu também teria que ver a cara que ela ia fazer, os dardos que seus olhos disparariam, a boca de onde inevitavelmente viria aquele palavrão instintivo. O horror, o horror...
Respirei fundo e preparei-me para o pior. Ela então disse:
- "Agora só falta você assinar, querido!"
A frase veio acompanhada de um sorriso que, estranhamente, me pareceu natural.
A resposta surrealista me desconcertou. Não combinava com o expressionismo abstrato de Pollock que eu acabara de criar em sua roupa. Mas ela continuava a sorrir naturalmente. Será que eu estava louco? Será que ela era louca?
Pedi então que me deixasse conduzi-la até o banheiro para jogar uma água sobre o casaco a tempo de evitar que a mancha de vinho tinto fizesse moradia permanente nas fibras de lã. Precisava muito recolher aquela moça dos olhares piedosos de quem estava ao redor. Afinal, o mico era meu não dela.
Na porta do banheiro ficamos eu e o meu amigo aguardando como pais numa sala de espera da maternidade. Eu pensava na possibilidade de cortar os pulsos com uma faca de plástico - para doer bastante - ou então fugir por uma saída pela esquerda, contanto que lá houvesse um elevador para o inferno.
O meu amigo estava tranquilíssimo (a moça era uma ex-namorada que havia se tornado sua amiga) e pediu que eu ficasse tranquilo também. Como? Impossível, hellooo, eu derramei vinho tinto sobre um casaco de lã com cara de super caro !
Ela estava se demorando um pouco para aparecer. Decidi ir para outro canto. Precisava sair daquela bolha desconfortável chamada "mico". Pedi licença e solicitei ao meu amigo que novamente dissesse à sua companhia que eu sentia muito, muito mesmo.
Encontrei em seguida alguns amigos e suas respectivas, e logo fui contar-lhes a história.
- Gente, preciso contar uma coisa: EU ACABEI DE PAGAR O MAIOR MICO DA MINHA VIDA.
Lá pelo meio do causo, as mulheres ao redor já estavam boquiabertas, os olhos molhados de lágrimas, não sei se por solidariedade à minha dor (!) ou se pelo sufocamento do desejo de rir. Ééé compadre... pimenta no cu dos outros é refresco!
Então ela apareceu. Acompanhada do meu amigo, lá vinha a moça do casaco de lã.
Ele estava imaculadamente limpo! Nem um resquiciozinho rosadinho sequer, nadica de nada daquela oferenda de Baco que eu havia usado para benzê-lo.
-"Mas o que é isso? Que milagre é esse???" (Por dentro eu já estava rezando minhas "salve-rainhas" e "santos anjos" de alívio e júbilo)
Sorrindo aquele mesmo sorriso de antes, a moça disse:
"O casaco tem proteção de teflon, querido!"
Estou a passear entre música boa, vinhos e canapés idem, quando encontro um amigo ilustrador, que apressou-se em apresentar sua companhia: uma moça bonita, vestida com um sobretudo off-white em grosso tecido trançado que ia até a metade das pernas. Figurino elegantemente paulista para aquela noite fria.
Mal colocado entre os dedos da mão esquerda que seguravam a base da taça de vinho tinto, o meu canapé escapole no momento em que preparo-me para cumprimentar a moça. Em gesto intuitivo, tento agarrá-lo em vôo. Mas a intuição não pensa, simplesmente age: para agarrar o canapé uso a mesma mão que segurava a taça de vinho tinto cheia.
Em uma fração de segundo vejo aquela pincelada de vinho em pleno ar rumo ao inexorável encontro com o canvas que era a bela roupa da moça.
Agora havia um mapa vermelho sobre o lindo e grosso tecido off-white do casaco. Não tenho idéia da cara que fiz, mas deve ter sido ridícula. Todas as caras ridículas do mundo estavam grudadas na minha face.
Seguro a moça confortavelmente pelo braço e peço mil desculpas, milhões, todas as desculpas do mundo. Por dentro sentia-me humilhado pela minha burrice, minúsculo pela absoluta falta de lubrificante social.
"Desculpe, por favor, desculpe..."
Aquilo durou um décimo de segundo e eu pude ver que havia tanto vinho derramado que uma pequena poça já se formava entre os pés da moça.
Sim, agora era a hora dela mesma olhar o casaco e ver a merda que eu havia feito. Agora eu também teria que ver a cara que ela ia fazer, os dardos que seus olhos disparariam, a boca de onde inevitavelmente viria aquele palavrão instintivo. O horror, o horror...
Respirei fundo e preparei-me para o pior. Ela então disse:
- "Agora só falta você assinar, querido!"
A frase veio acompanhada de um sorriso que, estranhamente, me pareceu natural.
A resposta surrealista me desconcertou. Não combinava com o expressionismo abstrato de Pollock que eu acabara de criar em sua roupa. Mas ela continuava a sorrir naturalmente. Será que eu estava louco? Será que ela era louca?
Pedi então que me deixasse conduzi-la até o banheiro para jogar uma água sobre o casaco a tempo de evitar que a mancha de vinho tinto fizesse moradia permanente nas fibras de lã. Precisava muito recolher aquela moça dos olhares piedosos de quem estava ao redor. Afinal, o mico era meu não dela.
Na porta do banheiro ficamos eu e o meu amigo aguardando como pais numa sala de espera da maternidade. Eu pensava na possibilidade de cortar os pulsos com uma faca de plástico - para doer bastante - ou então fugir por uma saída pela esquerda, contanto que lá houvesse um elevador para o inferno.
O meu amigo estava tranquilíssimo (a moça era uma ex-namorada que havia se tornado sua amiga) e pediu que eu ficasse tranquilo também. Como? Impossível, hellooo, eu derramei vinho tinto sobre um casaco de lã com cara de super caro !
Ela estava se demorando um pouco para aparecer. Decidi ir para outro canto. Precisava sair daquela bolha desconfortável chamada "mico". Pedi licença e solicitei ao meu amigo que novamente dissesse à sua companhia que eu sentia muito, muito mesmo.
Encontrei em seguida alguns amigos e suas respectivas, e logo fui contar-lhes a história.
- Gente, preciso contar uma coisa: EU ACABEI DE PAGAR O MAIOR MICO DA MINHA VIDA.
Lá pelo meio do causo, as mulheres ao redor já estavam boquiabertas, os olhos molhados de lágrimas, não sei se por solidariedade à minha dor (!) ou se pelo sufocamento do desejo de rir. Ééé compadre... pimenta no cu dos outros é refresco!
Então ela apareceu. Acompanhada do meu amigo, lá vinha a moça do casaco de lã.
Ele estava imaculadamente limpo! Nem um resquiciozinho rosadinho sequer, nadica de nada daquela oferenda de Baco que eu havia usado para benzê-lo.
-"Mas o que é isso? Que milagre é esse???" (Por dentro eu já estava rezando minhas "salve-rainhas" e "santos anjos" de alívio e júbilo)
Sorrindo aquele mesmo sorriso de antes, a moça disse:
"O casaco tem proteção de teflon, querido!"
15.6.08
Ditadores
Dois artigos recentemente publicados na página de opinião da Folha de São Paulo entraram em choque entre si. O primeiro, escrito por um militar, atribuiu à esquerda brasileira o endurecimento do regime militar na década de 60 e 70 como uma necessidade estratégica para fazer frente à luta armada, que queria instaurar aqui uma ditadura do proletariado. O segundo texto comenta, dentre outras coisas, o seguinte:
"A violência sempre foi cultivada pelos dirigentes militares, situando-se no centro da estratégia para consolidar o autoritarismo, cujo propósito era desmobilizar e despolitizar a sociedade e impor um modelo econômico que privilegiasse a rápida acumulação capitalista naquele contexto de Guerra Fria. A escolha da força para se obter obediência levou os órgãos de segurança a uma posição de destaque. Os órgãos da polícia política constituíam um dos núcleos centrais do poder, onde se destacava o SNI, comandado por generais do Exército, entre eles Golbery, o seu criador em 1964 e idealizador da distensão posteriormente executada por Geisel, chefe da Casa Militar de Castelo Branco que negou a existência de abusos cometidos pelo regime, e o primeiro presidente a admitir, após deixar o cargo, a tortura como meio necessário para obter confissões."
A América Latina há muito tempo tem sido um terreno fértil de ditadores: Galtieri, Pinochet, Stroessner, Noriega, Médici... Que continente politicamente desafortunado, que chocadeira de celerados!
Falando de Brasil, não há como justificar idéias absurdas como o plano de mandar o gasômetro pelos ares (frustrado por um militar que se recusou a levar a idéia adiante), ou, pior ainda, aquele atentado frustrado no Riocentro, quando planejava-se explodir uma bomba no meio da platéia de um festival de música durante o feriado do dia do trabalho (a bomba acabou explodindo dentro de um carro, precisamente no colo do sujeito encarregado da missão). Matar jovens em um show de música seria represália contra quem, me pergunto...
E pensar que houve um tempo em que se poderia ser preso ou morto por causa de um desenho satírico ou algumas desabonadoras linhas de texto.
Machado de Assis
Este mês faz 100 anos que o nosso escritor maior morreu.
Para registrar a data nas Alarcrônicas, coloco aqui uma ilustração que fiz para o seu "Conto de Escola". O original (pastel e lápis prismacolor) vai estar na exposição Ilustrando em Revista, que a editora Abril vai promover no Rio em Agosto.
Para ler a história completa, clique aqui (é curtinha e dá pra ler no intervalo do cafezinho).
Todo mundo devia ler o Machadão!
9.6.08
De volta do N-Design - Manaus
Acabo de retornar do NDesign 2008- WatyAmá, o grande encontro nacional de estudantes de Design, onde estive como palestrante convidado para falar sobre criatividade.
Este décimo oitavo encontro reuniu em Manaus mais de 1500 estudantes de toda parte do Brasil para debater os rumos da profissão, aprender, atualizar-se, confraternizar, celebrar e conhecer uma das regiões mais lindas do país.
A organização do evento foi excelente e fez a festa da maioridade do N-Design com bastante dedicação, profissionalismo e atenção aos detalhes.
O título WatyAmá faz referência ao rito de passagem da Tucandeira, quando jovens da tribo dos Saterê-Mauê têm suas mãos enfiadas em uma cesta cheia de saúvas. Este é não somente um gesto de coragem mas também de amadurecimento do indivíduo para enfrentar os desafios da vida adulta. O estudioso dos mitos, Joseph Campbell, certamente adoraria ver isso.
Pude conhecer muitas pessoas especiais nesta viagem, e, dentre os estudantes, destaco as meninas da organização do NDesign: Anny, Bia e Lara. Segundo elas mesmas me contaram, para realizar o evento tiveram que literalmente sacrificar os estudos e a universidade por quase um ano. Tenho comigo a certeza de que, o que elas aprenderam aqui em administração, logística, captação de patrocínio, trabalho em equipe, foco, estratégia, descascamento de pepinos e abacaxis e principalmente coragem, nenhuma universidade de design poderia ensinar.
Organizar o NDesign 2008- WatyAmá foi uma experiência que estes jovens vão carregar consigo pela vida inteira, como belas cicatrizes de formigas tucandeiras.
Além de promover uma infinidade de palestras, oficinas e mesas de debate, o encontro em Manaus serviu para os estudantes ampliarem seus círculos de amizades, curtir muitas festas, tomar umas e outras e celebrar este momento tão lindo, especial e exaustivamente cantado em verso e prosa: os "vinte e poucos anos"...
Em um emocionante documentário que assisti, um estudante baiano dizia que os NDesign "não deveriam servir de pretexto para se encontrar os amigos, para buscar sexo, bebidas, drogas e festinhas, mas principalmente para se discutir os rumos da profissão". Certíssimo até certo ponto, mas sigamos o exemplo de Buda: vale mais o caminho do meio. Se o N quiser encontrar um ponto de equilíbrio entre sua programação séria e de conteúdo relevante, adicionando à ela a natural aptidão das cidades-sede para o turismo e a confraternização das pessoas, o evento vai chegar ao seu melhor aproveitamento. Para um resultado melhor ainda, vale minha dica: se existe uma programação de oficinas e palestras pela manhã, as festas do dia anterior devem ter hora pra começar e hora pra acabar. E claro, o alojamento deve ter toque de silêncio a partir de uma hora razoável...
(isso porque é chato ver estudantes batendo cabeças e roncando durante as palestras...)
Tirei uma manhã para conhecer o porto de Manaus, que é um espetáculo à parte. De qualquer ângulo, o que se vê são personagens curiosíssimos, situações e flagrantes dignos de registro, seja pela câmera, seja pela ponta do lápis.
Passei uma manhã desenhando e aquarelando por lá, e pude constatar de perto a simpatia dos amazonenses. Para chegar "bem-chegado" desenhei logo o retrato de alguns e assim que o bolinho estava formado ao meu redor, fiquei à vontade para desfilar meu sotaque ridiculamente carioca e fazer uns desenhinhos e umas aquarelas.
Por causa dessa aquarela aí fiquei com a careca e os braços completamente vermelhos de insolação.
Teve até esse simpático sujeito aí em cima que, por livre e espontânea vontade, se dispôs a ficar do meu lado segurando um guarda-sol. Conversamos bastante e ele me contou diversos causos sobre os naufrágios no Rio Madeira, de águas velozes e traiçoeiras, e com corredeiras onde perigosos troncos estão a flutuar sem rumo. Ele me falou até de um acidente lendário que ficou conhecido como o "titanic do amazonas". Aquela infeliz embarcação tragou consigo mais de 50 vidas ao afundar.
O meu segurador de guarda-sol explicou que aqueles barcos geralmente viajam com seus porões sobrecarregados de mantimentos, sacos de farinha, carne, bebidas, eletrodomésticos e tudo o mais que as cidades ribeirinhas precisam. Por possuirem vários andares, que amontoam até 200 redes de dormir, o equilíbrio é precário. "O barco bate de noite num tronco, banco de areia, e daí roda cambaleando pra lá e pra cá" disse ele, "daí o povo acorda desesperado corre prum lado e pro outro tentando aprumar mas não tem jeito... vira mesmo e todo mundo some no redemoinho pra nunca mais".
Olhando os carregadores indo e vindo com toda sorte de coisas, e a infindável quantidade de pessoas penduradas em redes ao redor de toda a embarcação, pude ter uma idéia do inferno que deve ser uma viagem destas... Preciso muito voltar aqui e curtir essa experiência (3 dias e 3 noites até Santarém no Pará seria um bom percurso...) ! Tá anotado!
Os carregadores do porto são verdadeiros homens-mula. Vi um deles carregando dois sacos de mandioca com mais de 70 quilos cada.
Quem diria, Wolverine foi parar nos braços de um caboclo amazonense!
A galeria de personagens de Manaus é infindável.
Adiei meu retorno ao Rio para participar de um passeio de barco pelo Rio Negro até o encontro com as águas do Solimões. Por terem densidades e composições químicas diferentes, as águas destes rios não se misturam. É chá e café com leite, um de cada lado.
Nosso barco estava lotado de estudantes que vieram para o "N". Com uma hora de viagem atracamos em uma árvore em um afluente do rio para fazer uma pausa para o almoço.
Logo em seguida surgiram umas crianças remando suas frágeis canoas em nossa direção. Saíram de suas palafitas ao longe e nos trouxeram seus bichos de estimação (cobras, preguiças, jacarés e macacos) para tirarmos fotografias com eles. Fiquei curioso com os nomes das crianças: Arnold, Mick e Jonathan. Que poder tem a TV !
Olha o passarinho! Eu podia jurar que havia sorrido para esta foto...
Logo depois trocamos para barcos menores e partimos para conhecer os igapós e igarapés, que são as porções inundadas da floresta. Vimos também as vitórias régias, belos pássaros, árvores centenárias, botos, Yaras, Uirapuru, Curupira, Tupã e um pouco da riqueza da floresta.
Uma parte do igapó estava repleta de vitórias-régias.
Havia também uma pequena feira de artesanato local que vendia uns badulaques indígenas com sotaque pra turista. Fotografei uns peixes secos esquisitos que estavam sob uma lona azul. Coisa pra gringo ver.
Meu último passeio foi à pé ali pelo centro de Manaus, onde tomei uns deliciosos sucos locais e ouvi taxistas conversarem horrores sobre o governo "que não faz nada contra esse sueco e esse montão de gringo aí ó, tudo comprando a Amazônia...". Torço para que o ministro Minc (em quem já votei aqui no Rio) não se deixe infectar pela escrotidão paralisante que corre nas veias do poder federal.
Caminhei até o Teatro Amazonas, sob um lindo sol de fim de tarde. Pena que a visitação fechava às 5. A praça ali no entorno do teatro é talvez um dos lugares mais bonitos do centro de Manaus e vale a visita.
E para terminar o dia com chave de ouro, assinei uma petição do Greenpeace pela preservação da floresta amazônica. Passe lá você também para conhecer melhor o assunto, ver o vídeo e assinar.
Ficou decidido que o próximo NDesign será em Pernambuco. Boa sorte aos organizadores e que façam um evento tão bom quanto este de Manaus. Se quiserem minha presença novamente sentirei-me honrado.
Selecionado para o American Illustration
É com muita alegria que compartilho com vocês a notícia de que tive uma de minhas ilustrações selecionadas para participar este ano do American Illustration, um dos mais renomados anuários internacionais de ilustrações.
A ilustração foi capa da edição 1 do jornal Le Monde Diplomatique.
O número de inscrições deste ano superou a marca de 7500 trabalhos, dos quais 386 foram selecionados. Veja aquiPor tempo limitado até que os organizadores do AI oficializem a mostra online.
A ilustração foi capa da edição 1 do jornal Le Monde Diplomatique.
O número de inscrições deste ano superou a marca de 7500 trabalhos, dos quais 386 foram selecionados. Veja aquiPor tempo limitado até que os organizadores do AI oficializem a mostra online.
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